Notícias

Jogador abandona futsal do Corinthians para seguir carreira de funcionário público
29/07/2016 às 09:24
Imagine um jogador parar de atuar profissionalmente, antes do planejado, para assumir um cargo de concurso público. Isso aconteceu no Corinthians. No futsal do Timão. O ala/fixo Munin, de 34 anos, trocou a camisa 6 pelo crachá de bancário, com o nome Carlos Henrique.
Nascido no Piauí, mudou-se aos dois meses para Brasília, junto com os pais. Cresceu na capital federal. Foi criado numa região pobre, Planaltina-DF. Identificou-se com o futebol logo aos 8 anos, jogava bola na rua. Aos 10, recebeu o convite para jogar futsal no clube AABR. Ficou lá até a categoria sub-17. No sub-20, foi para a Asbac. Na equipe, inclusive, já treinava com o elenco principal, e pela primeira vez disputou a Liga Futsal, entrando poucos minutos. No entanto, ao invés de virar profissional no futebol de salão, surgiu outra oportunidade. Aos 20 anos, ganhou bolsa numa faculdade de Brasília e arrumou emprego. Na correria, conciliava trabalho, estudo e treinamentos. Passou a se destacar nos campeonatos universitários, em torneios regionais e já tinha conquistado vários títulos do brasiliense, em diversas categorias. Formou-se em Contabilidade, fez especialização em Auditoria.
Até que em 2010, teve a chance de virar profissional no Peixe Mazza-DF. Enfim, dedicou-se exclusivamente ao futsal. E em 2011 foi bem na Liga Nacional. A partir daí sua carreira decolou. Teve passagens por tradicionais clubes do país. Nos últimos anos, dividiu a quadra com os melhores jogadores do futsal brasileiro.
No mês passado, quando ainda defendia o Corinthians, recebeu a notificação de aprovação num concurso do Banco do Brasil. Fez seu último jogo profissional, no dia 20 de junho, na partida entre Corinthians e Carlos Barbosa pela Liga Nacional de Futsal. Uma semana depois, dia 27, tomou posse no seu novo emprego e voltou a morar em Brasília.
Em entrevista ao Portal Difusora, Carlos Henrique Marques Cavalcante, o Munin, revelou toda sua trajetória e contou as boas reviravoltas da sua carreira.
Confira:
Destaque
– Felizmente, fui muito bem na Liga Nacional em 2011 [pelo Peixe Mazza]. Consegui ser bem visto por outras equipes. Recebi uma proposta para ir pro Carlos Barbosa-RS. Acabei indo e fiquei um ano e meio. Metade de 2012 e 2013, ano em que fui campeão gaúcho e vice-campeão do Mundial de Clubes. Em 2014, transferi pro Concórdia-SC, fomos vice-campeões estadual, fiz um bom ano e em 2015 acabei me transferindo pro Corinthians. Realmente uma equipe de camisa, com torcida apaixonada. Fui campeão paulista de 2015, com jogadores renomados. Aquilo pra mim foi muito prazeroso, poder conviver com aqueles caras que eu só via pela televisão. Passava um filme na minha cabeça, tudo que eu passei pra chegar ali. Estar podendo dividir o dia a dia com aqueles caras, dentro do vestiário, nos jogos, nas viagens. Você olha pra trás e vê o tanto que batalhou para conseguir realizar um sonho.
Auge depois dos 30
Eu sou um cara que estudo muito o futsal, acompanho, vejo vídeos. Com 28 anos, foi quando surgiu a equipe do Peixe em Brasília. Uma equipe profissional, que treinava em dois períodos, de manhã e de tarde. A gente vivia de futsal. Então aquele período foi muito bom. Como eu já tinha me resguardado; tendo formação acadêmica, tinha currículo numa empresa privada. Trabalhei oito anos no Itaú, dos 20 até os 28; quando saí para ir pro Peixe. E depois dos 30 anos as oportunidades apareceram. Mas assim, eu falo do fundo do meu coração, eu sempre tive preparado. Porque sempre me cuidei, sabe. Agradeço muito a Deus, todos os dias, antes de dormir e na hora que levanto, eu nunca tive uma lesão séria. Então, quando cheguei aos 30 anos me senti um pouco mais amadurecido porque me preparei para aquilo. Não só fisicamente, mas psicologicamente. E graças a Deus eu tive o apoio da minha família. Da minha esposa, dos meus filhos, da minha mãe. Sempre estiveram ao meu lado. Isso é bastante importante, ter a família perto de você. Quando eu saí com 30 anos, pra Carlos Barbosa, eu fui sozinho. Deixei minha família em Brasília, porque era a primeira vez que eu estava saindo. Fiquei um ano longe da minha família. Foi uma dificuldade muito grande. Meus filhos eram pequenos. Minha esposa também trabalhava em Brasília. Não tinha porque eu tirar eles do conforto da nossa casa. Assim, foi uma mudança drástica. Então com 30 anos foi quando eu consegui alavancar e aparecer mais no cenário nacional. Ser reconhecido, tendo o respeito de muita gente. O intuito maior é continuar fazendo isso, mesmo sendo de forma amadora. O intuito de sempre estar promovendo o futsal. Buscando melhorias e conquistando títulos em todas as competições que eu puder jogar ainda.
Aprendizado com treinadores da Liga Nacional
Experiência tremenda. Acho que pra gente que está no meio do futsal é um sonho realizado. Tive uma linha de treinadores bastante diferentes. No Barbosa, treinei com o Paulinho Sananduva, depois ele saiu. Veio o Paulo Mussalém, que é um dos treinadores mais vitoriosos do futsal brasileiro, junto com o Ferreti. E em Concórdia, treinei com o Serginho. É um ex-atleta, ele jogou até os 44 anos, um cara super competitivo, apaixonado pelo futsal. Atualmente, ele é o treinador da seleção brasileira, é um cara que eu tenho como amigo. Então, assim foi uma experiência grande. Aprendi muita coisa. Aperfeiçoei também muitas coisas. Porque hoje o futsal é bastante estudado, é bastante tático. E tudo que eu aprendi, quero passar agora para onde eu estiver indo. E depois do Concórdia, fui pro Corinthians e ali eu peguei uma escala de treinadores com outros sistemas de jogo. Acabei vendo de tudo, entendeu?
Estilo de jogo
Quando eu era mais novo, era um cara muito mais agressivo, gostava muito de finalizar. Com o tempo você vai aprendendo as táticas do jogo. Atualmente eu mudei de posição, comecei a jogar de fixo, um pouco mais marcador. A minha característica de jogo é essa: competitividade, movimentação, mas claro com posse de bola, e na parte de ataque , passou a meia quadra, eu procuro sempre finalizar. Eu sou canhoto, mas eu aprendi a usar a perna direita. Quando eu era moleque, ficava em casa chutando bola na parede, batendo balãozinho e fui pegando. Comecei a botar na cabeça que eu tinha que chutar de direita, passar de direita e aprender a driblar com a direita. Graças a Deus fui aperfeiçoando cada vez mais. Isso foi fruto de muito treinamento. Mas eu sou canhoto mesmo de natureza. E a questão da garra, acho que o jogador quando entra dentro da quadra, independente da competição, ele tem que estar ali pra se doar, dar o seu máximo. Por ser um jogo emocionante, vibrante, eu penso assim. E trazer a torcida pra jogar junto, acho isso bastante importante.
Concurso
Eu sempre estudei. Sempre deixei algo resguardado. Porque caso desse alguma coisa errada [no esporte], eu teria como sustentar minha família. No início de 2012, quando eu estava em Brasília ainda, na época do Peixe, teve um concurso do Banco do Brasil e eu fiz. Estudei, me preparei e fui muito bem na prova. E acabei me classificando. Quando foi agora saiu a convocação. Eu estava em São Paulo, pra mim foi até uma surpresa, porque assim: eu sabia, só que não estava mais acompanhando. Foi um dia bastante atípico pra mim. A correspondência chegou na casa da minha mãe e ela me mandou. Quando eu vi falei: Caraca, é coisa de Deus mesmo. Eu estava com o pensamento de jogar mais uns dois, três anos no profissional. Pensando já em fazer alguma coisa pós-futsal. E graças a Deus surgiu essa oportunidade de estar assumindo este concurso. E fiquei muito feliz. Aí foi muito rápido. Tive que fazer a rescisão com o Corinthians. Coisa de 15 dias, fazer a mudança [volta para Brasília]. No futuro, quero passar tudo que eu aprendi nesses anos de futsal profissional. Com certeza, jogar todas as competições amadoras na nossa região, em Minas, Brasília, Goiás, Mato Grosso e poder levar cada vez mais o nome do futsal.
Jogar por Patrocínio-MG
Toda vez que eu vou em Patrocínio, vocês me tratam super bem. É uma cidade que respira o futsal, tem uma estrutura ótima. Com certeza, vamos alimentar essa ideia. Já houve o primeiro contato do Renan. Então, isso pra mim seria uma honra tremenda poder um dia vestir a camisa de Patrocínio. Porque é uma cidade que revelou grandes jogadores e está revelando grandes jogadores pro futsal do estado e pro futsal nacional.
NOTA: Recentemente, o patrocinense Renan Bouglex fez um convite para Munin jogar pelo Patrocínio Tênis Clube (PTC) na Copa de Futsal Band Triângulo. Porém, ele já estava acertado com a equipe de Tupaciguara-MG. A expectativa é que numa competição futura, Munin possa atuar pelo time patrocinense.
Profissionalismo para vencer
Desde garoto, sonhava em ser um jogador. E acabei concretizando isso. Pude ajudar minha família, pude de alguma forma ajudar minha mãe a criar minhas irmãs. Tive um problema com a separação dos meus pais quando eu era mais novo. Mas graças a Deus a gente venceu. Eu sou muito grato ao futsal por ter me feito não só como atleta, mas como cidadão do bem, pai de família. Isso que vou levar pro resto da minha vida. E uma outra coisa boa que o futsal me proporcionou: as amizades. Aonde eu vou, tenho portas abertas, porque sempre tratei as coisas com muito profissionalismo e respeito. Essa foi a minha sina, sempre respeitando as pessoas, me dedicando, me esforçando e lutando muito com bastante profissionalismo.
Por Filipe Ferreira
*entrevista feita pelo WhatsApp